A necessidade do uso de animais para o avanço da ciência
12/07/2008
O diretor da Faculdade de Medicina, Heitor Rosa, esclarece à sociedade sobre o uso de animais em pesquisas. No documento, que também foi publicado na edição do dia 11 de julho do jornal O Popular, o professor reitera o compromisso da UFG com os princípios éticos e com a qualidade do ensino, da pesquisa e da extensão.
POR QUE OS ANIMAIS SÃO NECESSÁRIOS À CIÊNCIA?
Heitor Rosa
Quem é a favor de maus tratos aos animais? Por certo, ninguém, principalmente as pessoas civilizadas ou com um mínimo de sensibilidade.
Então, por que grupos organizados rebelam-se contra os médicos e médicos veterinários que usam animais em pesquisa? Serão esses profissionais insensíveis, que sentem o prazer sádico da tortura, sofrimento e morte dos indefesos animais? Claro que não! Esses pesquisadores são pessoas sérias, com formação ética impecável, com preparo científico competente, que possuem família, filhos, animais e até religião, e sentem orgulho em trabalhar pela humanidade, mesmo incompreendidos.
Na verdade, o que acontece é isso. Falta de compreensão científica, esclarecimento adequado, uso da razão e bom senso, sem ações histéricas.
O debate entre os cientistas e os leigos não é fácil, pois o processo de pesquisa envolve aspectos extremamente complexos, como ética, ciência , mitos, sentimentos etc.
Mas não podemos negar que o avanço das medicinas humana e veterinária atingiram nos últimos trinta anos o que não foi possível em quinhentos. O progresso tecnológico, como a fabricação de novos medicamentos, técnicas de cirurgia ou diagnósticos devem à experimentação animal os benefícios que hoje desfruta a humanidade.
Neste artigo nós pretendemos demonstrar que quase todo ser humano ou não humano, que esteve ou está doente, deve de alguma forma sua esperança à pesquisa incansável feita nos laboratórios. São os animais que tornam a esperança possível.
Tipos de animais
A pesquisa utiliza, basicamente, dois tipos de animais: os de espécies pequenas ( camundongos, ratos, hamsters, coelhos,etc) e os de espécies de grande porte (cães, suínos, cavalos, macacos, etc).
Os animais de espécies pequenas são os mais comumente usados em pesquisas-95%- e principalmente em duas situações: a) na chamada pesquisa básica, para reproduzir e compreender os mecanismos de certas doenças, sistemas ou órgãos, seu funcionamento e as reações químicas ao nível das células. Essa fase é chamada de Fase 1. b) Para testar drogas (medicamentos) que têm possibilidade de curar ou melhorar uma doença aguda ou crônica, como o diabetes, leucemia, Alzeihmer, doença de Parkinson, infecções, epilepsia, infertilidade. Só com os testes nesses animais, podemos saber qual a dose eficaz, quais os efeitos colaterais, sua ação sobre a gravidez e os embriões ,etc. Essa fase de pesquisa é chamada de Fase 2. Não podemos usar uma droga no ser humano, cujas doses e efeitos colaterais sobre todos os órgãos são totalmente desconhecidos. Um medicamento só é liberado para ser testado no homem, depois de ter sido aprovado em rigorosos testes de segurança e eficácia nos pequenos animais. Foi a falta de teste em outra espécie animal que não só o roedor que provocou o desastre da Talidomida, há 50 anos, cujo uso em mulheres gestantes levou ao nascimento de bebês sem braços, sem pernas etc. O estudo e prática da fertilização e clonagem só se tornaram possíveis graças às investigações em embriões de animais ( lembram da ovelha Dolly?) , até ao seu desenvolvimento e aplicação para o ser humano.
Os animais de grande porte têm incontáveis usos. Citamos alguns exemplos:o cavalo ( produção de vacina contra varíola, soro antiofídico), cães ( raiva) , macacos ( hepatite, câncer, leucemia). A escolha do porte ou espécie depende do que se pretende estudar, não sendo, portanto, arbitrária.
Detendo-nos nos cães ou suínos, realçamos que eles são utilizados principalmente em novas técnicas cirúrgicas ou no aprimoramento de habilidades de cirurgiões. Dessa forma, os transplantes de rins, coração, fígado, pulmão, pâncreas só se tornaram realidade para o homem, após persistentes estudos em animais, com protocolos bem definidos com respaldo dos Comitês de Ética.
Em microcirurgias nas fases inicias de treinamento podem ser usados modelos artificiais, cadáveres, etc. e nos estágios finais devem ser usados animais vivos.
No Reino Unido isto é reconhecido - o treinamento de técnicas cirúrgicas só é permitido sob supervisão de pessoa capacitada (exigido por lei).
Esta prática foi abolida em alguns países e em um deles, como conseqüência desta proibição houve aumento de morbidade e de mortalidade nos hospitais, porque os cirurgiões não haviam tido treinamento prévio com animais vivos. Como conseqüência alguns profissionais foram fazer treinamento no exterior onde era possível usar animais vivos.
A cirurgia laparoscópica, nos dias atuais é uma técnica sem retorno. Através dela operamos vesícula, próstata, apêndice, ovários,etc,e ninguém se nega a ela se submeter, se puder optar entre essa técnica e a tradicional ( cortar a barriga, grandes cicatrizes, longo pós-operatório). Entretanto, para alcançar esse grau de segurança e habilidade, o cirurgião teve de provar que o método funciona e adquirir técnica em animais. Ninguém faria isso no Homem, sem estar devidamente preparado e seguro do resultado. O Homem não é objeto de experiência nazista.
Quais as condições para o experimento ?
Vamos enumerar as principais condições ( são dezenas) que permitem, o experimento em animais:
- O experimento ou procedimento deve ser aprovado por um Comitê de Ética Humana e Animal (CEP), assim como ser submetido ao Conselho Nacional de Ética em Pesquisa ( CONEP), se assim decidir o CEP. O CEP é formado por vários elementos da sociedade, como por exemplo, o do Hospital das Clínicas da UFG é constituído por médicos, médico veterinário, teólogo, jurista, filósofo, enfermeiro, representantes de classes etc. Na maioria dos países há legislação referente ao uso de animais em ensino, testes e pesquisas, sendo bastante rigorosas e seguidas fielmente. Esta legislação enfatiza o papel do Comitê de ética para evitar o sofrimento dos animais.
- O pesquisador deve obedecer aos Princípios Éticos no Uso de Animais, comum a diversos países, que ,entre outras coisas, exige o seguinte:
• o animal deve receber tratamento humanitário ( alimentação, água, higiene,proteção, bem-estar);
• o ato cirúrgico ou experimental deve impedir a dor ou sofrimento, com o uso de analgésicos e anestésicos.
• o pesquisador ou cirurgião deve também assegurar o procedimento de três Rs: Reduction ( Redução) do número de animais, sempre que possível; Refinement ( Aprimoramento) técnico, para obtenção dos objetivos rapidamente, evitar sofrimento e repetições desnecessárias e Replacement ( Alternativa), ou seja, outros meios que não os animais, sempre que for possível.
Na maioria dos exemplos acima, não é possível substituir o animal, pois não se dispõe ainda de modelos que substituam a fisiologia do ser vivo, nem permitam que uma técnica cirúrgica seja feita num animal morto,manequins ou modelos virtuais (computador). É o caso da cirurgia laparoscópica, transplantes, etc. Também não pode ser avaliada a profundidade de uma anestesia. Algumas alternativas são tão caras e de resultados duvidosos, que os países mais ricos têm restrições ao seu uso.
Mais antiético que usar animais é usar alternativas que não sejam cientificamente validadas pelos órgãos especializados.
- Para a prática do ensino do currículo médico, há necessidade da assistência de um médico veterinário quando forem utilizados animais.
E se a medicina experimental for impedida?
Sem dúvida a pesquisa médica vai parar quase totalmente. Novos medicamentos e cirurgias não serão conhecidas. Doenças como a AIDS, asma, câncer, Halzeimer, Parkinson ou antibióticos e vacinas terão de esperar por novos tempos.
Será que as pessoas que hoje gritam contra o uso correto e honesto de animais na ciência, recusariam o benefício, para si ou um filho, de um antibiótico, analagésico, anti hanseniano ou a uma cirurgia laparoscópica, pelo fato de resultarem de um experimento em animal? Serão capazes de serem coerentes com suas campanhas e dizer Não aos benefícios que a ciência experimental oferece à humanidade? Como iremos tratar mais de 28 milhões de deficientes auditivos-só nos USA- se não buscarmos novos tratamentos para os mesmos? E os 14 milhões de alcoólatras existentes neste país que esperam sejam descobertas as causas físicas deste problema?
Quais são as fantasias?
Essas ficam por conta do imaginário de cada um. Atos de canibalismo ( um cão comendo outro, doente), operações sem anestesia com animais urrando de dor, abrir e fechar a barriga do animal, várias vezes, para treinamento de estudantes,etc...É o non-sense, a divulgação do absurdo, um insulto à dignidade médica. Algumas pessoas “ficaram sabendo”, outras “fotografaram”. O fato é que, no ativismo, as notícias divulgadas prescindem de provas e são tidas como verdades irrefutáveis, cuja análise deixa o bom senso de lado. Nenhum dos detratores da ciência jamais entrou ou assistiu um pesquisa ou cirurgia, entretanto, ao examinar uma foto,não interessa saber sua origem. Quem examina uma foto pode ver, entretanto não vê; só vê o que quer ver (paráfrase de Vargas Llosa). Por que não cantam a vitória sobre a poliomielite ou a raiva, cujas pesquisas vieram do laboratório? Questionaram como foram feitas essas experiências? É comum a ciência sofrer ações contrárias ao seu desenvolvimento; foi assim com Oswaldo Cruz, quando obrigou a vacina contra febre amarela; com Jenner, quando descobriu a vacina contra a varíola. Só o diálogo e a vontade de aprender, com humildade, pode restaurar a compreensão entre o leigo e a ciência.
O que é a Faculdade de Medicina da UFG?
Ao completar seus cinqüenta anos de fundação, foi recentemente colocada entre as cinco primeiras do país ( num universo de 130 escolas), após o resultado do ENADE feito pelo MEC, e mais recente, a Comissão de Avaliação das Escolas Médicas da ABEM ( Associação Brasileira de Escolas Médicas) a considerou como “tipologia inovadora com tendência avançada”.
Sites internacionais
A FM obedece aos critérios éticos mundiais, como por exemplo aqueles empregados na Comunidade Européia, Canadá e USA. Consulte, os seguintes sites:
www.ccac.ca
www.aalas.org
www.apa.org
www.frame.org.uk
www.ufaw.gov.uk
www.cioms.gov
www.oie.int
www.fbresearch.org
www.amrc.org.uk
www.wabr.org
Heitor Rosa
Diretor da Faculdade de Medicina da UFG
Doutor em Medicina. Professor Titular de Gastroenterologia
P.G. British Post-Graduate Medical School. Londres
Confira também a nota de esclarecimento publicada pela Reitoria da UFG sobre as fotos que circulam na internet, referentes ao canil da Faculdade de Medicina.
Leiam: Experimentação Animal - Por que médicos antivivisseccionistas? http://libertacaoanimalbrasil.blogspot.com/2008/07/experimentao-animal-por-que-mdicos.html
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